terça-feira, 20 de maio de 2008

Carta de uma missionária.



Bosnia e Herzegovina, Zenica 26 de julho a 27 de outubro de 2007


Não quero pensar de mim mesma, além daquilo que me convém.(Rm12.3)

Mas, falar do meu Senhor Jesus Cristo e de sua boa obra em mim e' inevitavel. A presença do Espirito Santo em nós, e' motivo de constantes mudanças. Do mesmo modo, como o barro esteve na mão do oleiro, assim sinto-me na mão do meu Senhor, como barro... nada mais que o barro...

Usando apenas as maos, pode o artesao dar ao barro a forma que lhe agradar, nao agradando, desfazer de sua obra e a faz de novo. Assim é o Senhor, Ele tem uma meta, um único alvo; restaurar em nòs a semelhança do caráter de seu filho JESUS CRISTO; levar-nos a termos o mesmo sentimento; esvaziando-nos de nós mesmos, para que sua obra(que somos nós) revele o quão boa, agradável e perfeita é a sua vontade. Tomando nos por filhos e incluindo nos em sua familia, uma familia chamada a viver em santidade, refletindo o reino de Deus na terra, assim como é no céus. Se a imagem do vaso nao reflete a semelhança do seu filho, ele o desfaz, e o faz de novo. Temos a sensação de que fomos moidos, e nos sentimos humilhados. No entanto, o barro torna-se mais macio e maleável, podendo ser melhor manipulado. Este processo tem grande semelhança conosco, o homem que se sujeita deixando-se humilhar é aproveitável no reino de Deus.

Glórias e glórias sejam dadas ao nosso majestoso Deus que não desiste de sua obra. Se o artesão conhece a qualidade do barro e como trabalhar; muito mais o nosso Senhor conhece a natureza humana e seu coração, podendo restaurar-nos à semelhança do seu filho por meio de sua virtude e sabedoria. Em suas mãos temos uma outra chance; o homem que teme a Deus conforma-se com os Seus meios, entrega-se, não resiste.

José do Egito compreendeu bem as situações permitidas por Deus em sua vida. Ainda menino, imaturo para a obra, pelo qual havia sido chamado, suportou e perseverou ... até o dia em que lhe foi revelado o propósito Daquele que o havia chamado.
Os pensamentos de Deus são mais altos que os nossos, e sua visáo ampliada leva-nos a caminhos jamais experimentados. Que obra! Que privilegio! Estar nas mãos de um Homem que pode transformar-nos.

Quando penso em missões, penso em homens que não pouparam privilegios e entregaram-se a Deus e aos desafios. São caminhos áridos e ao mesmo tempo mananciais. Há tribulacões, no entanto, o gozo do senhor é onipresente.
Aparentemente é uma terra egocêntrica, onde nem sempre os que semeiam e plantam serão os que colhem. Mas, que mérito há se não entendermos que só um dá o crescimento, Jesus Cristo, e que está gloria é exclusivamente Dele?

Há um versículo que bate junto as batidas do meu coração: MARTA, MARTA, ESTÁS ANSIOSA E AFATIGADA COM MUITAS COISAS, MAS UMA SÓ É NECESSÁRIA.(Luc.10:41) Entendo que a comunhão com o Pai é a base de tudo. Uma comunhão de unidade; eu, JESUS E O PAI, primeiramente precisamos ser um; para depois levar o mundo a crer através de nós que seu filho foi enviado, sendo as nossas obras as mesmas de nosso Pai. Realizar a vontade Daquele que nos envia é de fato, a comida pela qual temos fome.

Missões, vai além do que posso imaginar; não fazemos idéia do que Deus é capaz... mas, como está escrito: nem olhos viram, nem ouvidos ouviram, nem jamais penetrou em coração humano o que Deus tem preparado para aqueles que o amam.(1co.2:9) Tudo que aprendi nestes meses, é que o nosso Deus é o mesmo da eternidade, apresenta-se apaixonado como dantes, aguardando o arrependimento da amada Jerusalém. Seus olhos, ainda consumidos pelas lágrimas derrama-se a favor do quebrantamento da filha do seu povo. Que testemunho te trarei? A quem te compararei, ó filha de Jerusalém?(Lam.2:11,13)

Minha vida nao faz sentido em si mesma, ando insaciável por conhecer mais e mais Aquele que é o que é ,e que nao tem limite nem fim. Permanecer apaixonada é um desafio, tanto quanto ,não deixar a minha mente ser corrompida e apartar-me da simplicidade e pureza devidas a Cristo. Só há um caminho, uma verdade , uma vida.... capaz de saciar-nos, a pessoa de JESUS CRISTO,seus planos, seus sonhos.

Ouvi uma expressao que eu ja vivi,*os que ficam estão envolvidos com seu dia a dia e facilmente se esquecem dos que foram. Quero te
pedir para que esta expressao nao faça parte de sua realidade, os que foram precisam, necessitam muito dos que ficam como retarguarda, lembrando de nós em suas orações, fortalecendo nossos sentimentos e corações, muitas vezes abalados por todo tipo de pressão,mantendo o elo da amizade e companherismo mesmo que a distância dificulte a proximidade.

É meu prazer levar a vocês um pouco de mim. Que minha vida em Jesus Cristo possa de alguma forma edificá-las. Porque se tenho do que gloriar-me, gloriar-me-ei no que diz respeito à minha fraqueza.

A graça do Senhor Jesus Cristo, e o amor de Deus, e a comunhão do Espirito Santo sejam com todas vocês.

Lindabel Viana

segunda-feira, 12 de maio de 2008

O Sonho

O Sonho
Sonhei que eu tinha morrido
Não lembro direito de quê
Me vi frente a um alto e belo portão
Com uma placa escrito: Céu

Bati com um certo receio
Um anjo saiu pra atender
Me disse: “ Pois não ? “ – eu falei; quero entrar
Pois aí é o meu lugar

O anjo me disse: “curioso,
Eu não acho o seu nome em nossos registros”
Eu disse: procure num livro antigo
Escrito antes que houvesse mundo
E ali achará com a letra do Rei
Meu nome com tinta vermelha

Alguém entregou para o anjo
Registros que eu reconheci
Compêndio de todas as leis que eu quebrei
E os pecados que cometi

O anjo olhava os registros
Visivelmente assustado
E me perguntou: “ Foi assim que viveu? “
E eu então respondi que sim

“ Então como é que você tem coragem
De vir nessa Porta bater? “
Eu disse: olhe bem no final dessa lista
Você reconhece esta letra?
E o anjo sorrindo me disse:
“ É verdade!!! O Rei escreveu: Perdoado! “

E ao som dessa bela palavra
Aquele portão se abriu
Então eu entrava cantando um hino
Que pena que o sonho acabou
Ficaram comigo aquelas palavras:
“ Primeiro eu quero ver meu Salvador” .

Fim de tarde no portão.




Fim de Tarde No Portão

Stênio Március

Composição: Stênio Március

Fim de tarde no portão
A cabeça branca ao relento
Teimosia de paixão
Faz das cinzas renascer alento

Na estrada o seu olhar
Procurando um vulto conhecido
Espera um dia abraçar
Quem diziam já estar perdido

O seu amor é tão forte
Mais que o inferno e a morte
São torrentes que arrebentam o chão
Mais fácil secar os mares
Apagar a estrela antares
Que arrancar o amor de seu coração
Fim de tarde se debruça no portão

Mas um dia aconteceu
E o moço retornou mendigo
O pai depressa correu
E abraçou o filho tão querido

Tragam roupas e o anel
Calçem logo os seus pés, milagre!
Vinho do melhor tonel
Tanta alegria em mim não cabe

O seu amor é tão forte.....
Fim de tarde está deserto o portão

terça-feira, 22 de abril de 2008

Tragédia, milagre e fé.

Por muitas vezes me surgiu a dúvida, -afinal, o que é fé?! -Porque os Cristãos sofrem? Falta-nos fé?
E aos poucos vou entendento, pelo amor de Cristo por mim, que fé não é reger os braços de Deus, mas sim confiar que o que quer que Ele tenha para nós, é o melhor.

E que obstáculos, tristezas, momentos difíceis, são necessários à construção do nosso caráter Cristão.

Como aconteceu na história do "Pequeno Principe", quando ele conversando com sua Rosa de estimação, procurando protegê-la dos males, ela o surpreende e diz:

-"...É preciso que eu suporte 2 ou 3 lagartas, se quiser ver as borboletas..."

Abaixo, segue um belo texto que ilustra um pouco dessa questão.

PAZ!



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Tragédia, milagre e fé.

Ricardo Gondim.

Minha vida se organizou também com tragédias. O primeiro grande drama aconteceu na breve existência de minha irmã caçula, que viveu apenas dois dias. Ela se chamava Gelsa, em homenagem a uma tia muito querida; era gêmea do Sergio, que sobreviveu. Recordo nitidamente o desespero que nos sobreveio naquela época. Era véspera do Natal e o papai estava preso; morríamos de medo da polícia política dos ditadores e convivíamos com vergonha social - a vizinhança parava na frente da casa do “subversivo” - rótulo dado aos delinqüentes ideológicos, que mereciam tortura.

Gelsa nasceu sem intestino e com uma hérnia umbilical estrangulada. Veio ao mundo, portanto, já condenada a morrer de fome. Em 48 horas, como os médicos prenunciaram, minha irmã se desidratou; sem conseguir digerir o leite materno, sucumbiu à inanição. Eu a segurei nos braços por apenas 30 segundos. Quando mirei seus olhos fechados, chorei lágrimas pré-adolescentes e provei um sal amargo, que ainda reconheço.

Devolvi a minha irmã para um adulto e saí para fazer a primeira oração consciente que me lembre. Desesperado, clamei a Deus - não recordo as palavras exatas: “Meu Deus, por favor, não deixe a minha irmã morrer; não permita que a mamãe sofra mais; na cadeia o papai não vai agüentar”.

Não fui atendido. Deus não respondeu. Os céus se blindaram à voz de uma criança. Dois dias depois, nossa família aflita chorou ao lado da sepultura.

Desde essa primeira tragédia até hoje, meados dos 50 anos de idade, já testemunhei angústias semelhantes. Nunca esquecerei aquela tarde. Meia hora antes de pregar, fui chamado para orar por uma criança de nove anos de idade que agonizava com leucemia. Logo que entrei no jardim da casa, seu pai me abraçou. O desespero daquele homem arranhou o meu coração: “Pastor, peça a Deus para tirar o câncer da Beatriz e colocar em mim. Não soporto o sofrimento da minha filha”. Quando me aproximei da menininha, deitada em posição fetal, magérrima e sussurrando uma dor atroz, joguei-me de joelhos ao lado da cama.

Pela segunda vez, clamei desesperado por uma menina. Eu via a irmã que perdera. “Deus, tenha misericórdia desta criança; por meio de teu filho, cura a Beatriz”. Novamente as palavras bateram contra portas de aço. Poucos dias depois, acompanhei a família ao mesmo cemitério onde minha irmã jazia.

Recordo-me de uma família de missionários que inutilmente pediu, jejuou, convocou uma multidão de “intercessores”, para que a filha de 17 anos não morresse – a jovem havia caído de uma motocicleta, bateu a cabeça no asfalto e teve morte cerebral.

Quando vi o Ângelo - ele era líder de jovens de nossa igreja - se contorcendo após um acidente automobilístico, perguntei ao médico o que as convulsões indicavam. Com lágrimas nos olhos por ver um rapaz de 19 naquele estado, respondeu-me: “Ele está ‘des-cerebrando’”. Ajoelhei-me na UTI do Hospital São Paulo como se implorasse por meu filho. O Ângelo morreu 10 dias depois.

Paradoxalmente, acredito em milagres. Sei que outras pessoas contam eventos opostos. Respeito-as e não duvido de nenhuma experiência fantástica de livramento, provisão, resgate e cura. Entendo, inclusive, o desatino de procurar invalidar as narrativas de milagre; não me proponho a esta tarefa, que considero perniciosa.

Quero, tão somente, dar esperança aos que, como eu, amargaram o silêncio divino. Multidões não receberam resposta quando imploraram por milagre na hora mais horrorosa: “Meu Deus, meu Deus, por que me desamparaste”. Procuro ajudar as pessoas a não perderem a fé porque tinham expectativa de cura e acabaram se frustrando. Alguns apelaram desde o abismo da aflição, mas não tiveram resposta nenhuma. Pretendo mostrar que os silêncios divinos não são descaso ou desamparo, mas a condição, o jeito, como Deus soberanamente organizou o mundo.

Considero, inclusive, que nossas inquietações possam ser respondidas na tentação de Jesus no deserto. Trato o episódio como chave de compreensão de como podemos lidar com a vida.

O Espírito levou Cristo até o deserto para ser tentado. Ali o diabo ofereceu três vantagens para que Jesus enfrentasse o desafio de viver: provisão, livramento e prosperidade. Caso aceitasse transformar pedras em pães, todos os famintos do mundo poderiam reivindicar a mesma coisa; se pedisse o socorro dos anjos, todos os acidentes seriam “evitáveis”; ao receber os reinos do mundo por decreto, o livre arbítrio humano ficaria anulado. Jesus rejeitou ter a fome satisfeita por magia; não permitiu que se criassem expectativas falsas de um mundo sem percalços; e rechaçou conquistar os reinos deste mundo pelo poder. Preferiu mostrar em sua própria vida que liberdade era a maior dádiva que Deus nos concedera.

Em minha caminhada como pastor e estudioso da Bíblia constato que as comunidades religiosas interpretam os milagres dentro de “zonas de plausibilidade”, isto é, faz-se do sinal e da maravilha a prova que legitima a pregação. Como os milagres mais complicados de se concretizarem poderiam invalidar a mensagem, os líderes se concentram nos que têm boas chances de “realmente” acontecerem. Assim, evitam-se as doenças "mais complicadas" e perde-se de vista, infelizmente, os que mais sofrem.

Olho para minha trajetória e reconheço: nos momentos mais cruciais da vida, na hora em que mais se precisava de um "enorme" milagre, ele simplesmente não aconteceu.

Sinto que a antiga dor de ver a minha irmã morrer de fome, somada às inúmeras tragédias que já presenciei, me despertaram a repensar o conceito de fé. Desejo advertir as pessoas que organizam a vida esperando possíveis milagres e dizer que terão enormes chances de se frustrarem. Temo que se decepcionem com Deus, com o que se entende por fé e com a vida.

Fé pode sair do estágio infantil como força que “consegue mover o braço de Deus” ou de “abrir as janelas do céu” para ser uma coragem. Fé é uma aposta de que a sabedoria divina, com seus princípios e verdades, basta para que enfrentar os percalços e tragédias da vida.

Assim, convido os que já sofreram para que olhem a vida como uma maratona. Para vencê-la, socorros sobrenaturais não são essenciais. Jesus de Nazaré encarou a história sem pedir a ajuda de anjos. Ele não evitou a cruz e, por isso, triunfou. A mensagem do Evangelho não promete imunidade ou alívio das tribulações, mas bom ânimo; o frágil Carpinteiro venceu na hora mais desolada. Em seu clamor, “Eloí, Eloí, lama sabactani”, encontramos uma certeza: é possível triunfar mesmo sem sermos poupados da morte.

Soli Deo Gloria.

segunda-feira, 31 de março de 2008

De qual salvação estamos falando?

Este texto foi retirado do site do Pr Ricardo Gondim (www.ricardogondim.com.br). Trata-se de uma "conversa" que o Pr. está tendo com outra pessoa, o Diego.
Não sei dizer se essa pessoa (Diego) realmente existe e se esse é o nome dele, ou se é uma criação do Gondim para conseguir passar seus pensamentos.
De qualquer maneira, é um texto muito sério, profundo e que vale a pena ser refletido.

Boa leitura.


Paz!





Mentoria - De qual salvação estamos falando?

Ricardo Gondim.

Querido Diego,

Por favor, desculpe-me pela demora em escrever. Ando sobrecarregado. Mas preciso voltar à sua antiga pergunta sobre a missão do pastor.

Passei por crise semelhante. Por volta dos meus quarenta e poucos anos, perguntei-me o que fazia da vida. Cansei dos esquemas dos evangelistas itinerantes. Eles me entediavam com suas pregações repetitivas. Caíram algumas vendas e vi os interesses escusos dos missionários estrangeiros que tiravam fotografias de eventos brasileiros para fazerem propaganda nos Estados Unidos. Chorei amargamente quando notei que os “caciques” das grandes denominações eram mais grosseiros que os políticos de que eu desdenhava.

Acordei também para os meus pecados sutis. Vi que não só partilhava de um mundo religioso doente, mas o reforçava com uma vaidade sedenta de prestígio. Eu sabia, mas não queria abrir mão, da minha vontade louca de aparecer. Eu queria construir um nome e tornar-me notório pela “unção”, “autoridade”, “loquacidade”. Ah, como eu já quis despontar como um “pastor bem sucedido”! Queria ser igual aos famosos que conhecia, principalmente os estrangeiros, que arrebatavam multidões.

Esses messianismos, essas falsas onipotências, começaram a desmoronar depois de um culto quando uma jovem fez algumas perguntas desconcertantes. Marli (nome fictício) era graduada em filosofia na Universidade de São Paulo e, devido ao seu senso crítico, me confrontou com serenidade.

“Ricardo, cadê a vida abundante prometida por Jesus”?. Pego assim de supetão, eu não soube o que responder. Tentei me safar com outra pergunta. “O que você quer saber?”, na verdade eu só queria ganhar tempo com minha réplica. Ela não cedeu: “Pastor, quero entender. O que Jesus prometeu tem conexão com a realidade da vida? Ou a vida abundante que ele falava era apenas um desejo utópico dos apóstolos?”. Nervoso, insisti em perguntar ainda procurando ganhar tempo: “Como assim?”. “Se Jesus prometeu que seus seguidores experimentariam vida abundante, quero saber por que não vejo acontecer concretamente?”.

Nessa hora tive que dar a mão à palmatória. “Marli, você tem razão a vida abundante prometida por Jesus aparece muito mais nos discursos do que na concretude da vida. Entretanto, o problema não é dele ou dos apóstolos, mas nosso”.

O discurso religioso promete muito mais do que cumpre. Dificilmente constatam-se evangélicos com qualidade de vida melhor do que as pessoas não convertidas. Problemas conjugais, instabilidade emocional, patologias psíquicas, permanecem intocados na grande maioria das igrejas que alardeiam que seus fiéis terão uma “vida abundante”. Enquanto os auditórios se maravilham com discursos triunfalistas que asseguram o melhor casamento, felicidade total no trabalho e paz duradoura, enormes problemas são varridos para debaixo dos tapetes ou justificados como “falta de fé”, “desobediência”; ou resultado de “ataques do diabo”. Por que isso acontece?

Priorizou-se a “salvação” como uma esperança a ser alcançada depois da morte. E as igrejas, cada uma se acreditando mais legítima, se especializam em oferecer o bilhete para a vida eterna - que só vai começar quando o coração parar de bater. Assim, meticulosas em “dar certeza da salvação” aos seus convertidos, não se preocupam em ensinar como viver do lado de cá. Com esse modelo, comumente se vê gente segura de que vai para o céu, mas sem saber lidar com os momentos triviais da existência.

Em minha experiência pastoral, já tive o desprazer de aconselhar mulheres super espirituais, que se gabam do nome estar “escrito no livro da vida”, mas intoleráveis, mal-resolvidas e tristes. Recentemente precisei gastar três horas com um pastor que há anos prometia o céu para quem “levantasse a mão para aceitar Jesus”; só que ele não sabia resolver seus dilemas sexuais. No meio de nossa conversa, abatido ele me confidenciou: “Ricardo, estou vivendo num inferno”.

Sua missão, meu caro Diego, é ajudar às pessoas a tratarem a vida eterna como uma possibilidade para aqui, para a terra. Aliás, a dimensão transcendental da salvação não compete a você; não depende de seus esforços e não acontecerá como resultado de sua confiabilidade ou unção. Salvação, vida eterna, foi conquista da cruz. Ela é obra vicária de Cristo, o mérito será sempre dele. Vida eterna é distribuída indistintamente a todos pela graça; e só o Espírito Santo convence do pecado, da justiça e do juízo.

Concentre-se em mostrar que o reino de Deus é chegado e que está entre nós. Livre das condenações da lei, sem precisar compensar os pecados com penitências e, sem ter que ganhar o favor divino com obras, a humanidade pode dar início ao projeto de humanizar-se. Neste propósito divino, crescemos em maturidade, nos solidarizamos com os carentes, exercitamos misericórdia e sempre defendemos a justiça.

Você precisa desvencilhar-se do antigo modelo de evangelização, que promete uma salvação para depois do último fôlego. Comece a pregar a chegada do Reino, só assim as pessoas se sentirão estimuladas a mudar e essa tarefa é extraordinária.

Mude o mote de suas pregações. Aborde questões práticas sobre matrimônio, polidez, cordialidade, cidadania, vulnerabilidade, altruísmo, compaixão, preocupação ecológica, dignidade da mulher, educação infantil. Acredito que o cristianismo verdadeiro deveria preocupar-se muito mais com o jeito como as pessoas guiam seus automóveis do que em dar-lhes “garantias” de que vão para o céu.

Não, não pense que desconsidero o céu; essa é nossa esperança eterna, nossa maior riqueza. Contudo, eu realmente creio que o destino eterno de cada indivíduo foi garantido pelo sacrifício de Cristo na cruz e que, não precisando mais nos preocupar com esse importantíssimo assunto, podemos nos concentrar nos demais. Alguns são, sim, menos importantes diante da eternidade, mas fazem uma enorme diferença para a felicidade das mulheres, maridos e filhos.

Minha sugestão é que você releia os Evangelhos; procure as mensagens em que Jesus ensinou a ganharmos a vida no presente. Você se lembra daquela passagem de Mateus 16.26? “Pois, que adiantará ao homem ganhar o mundo inteiro e perder a sua alma? Ou, o que o homem poderá dar em troca de sua alma?”. Antigamente eu entendia esse texto como uma advertência para que não me tornasse um grande conquistador ou um milionário e acabar no inferno. Hoje eu o leio numa dimensão existencial. Acredito que Jesus advertia seus discípulos para que não tentassem nenhuma conquista, se no processo perdessem a alma existencialmente. Para Jesus não adianta querer ter tudo (inclusive o céu) se nessa busca nos tornarmos amargos, calculistas e torpes.

As religiões, o cristianismo inclusive, já garantiu que muita gente inclemente, perversa e promotora da morte iria para o céu. Infelizmente!

Eu já não peço que as pessoas levantem a mão, concordando com a minha pregação; como também não lhes asseguro que, daquela hora em diante, receberão um selo que lhes garantirá o céu. Hoje convido as pessoas a começarem uma peregrinação. Cientes do amor de Deus, todos podem tomar o caminho proposto por Jesus de Nazaré. Nesta trilha, na companhia do Espírito Santo, todos se tornarão novas criaturas.

Você vai precisar de muita coragem para remodelar seu ministério, mas conte com minha ajuda e intercessão.

Soli Deo Gloria.

segunda-feira, 17 de março de 2008

Proposta de espiritualidade

Proposta de espiritualidade
Ricardo Gondim

Não é preciso muita perspicácia para perceber que o movimento evangélico ocidental passa por uma grande crise. As incursões do neo-fundamentalismo da direita religiosa na política estadunidense não ajudaram muito.

Os reclames de que a sociedade preservasse "valores morais" caíram por terra porque não encontraram respaldo nas próprias igrejas, que se revezaram em escândalos. Para agravar a crise, grandes segmentos evangélicos se apressaram em legitimar a invasão do Iraque, argumentando que a Bíblia respaldava uma "guerra justa".

Na América Latina, principalmente no Brasil, a rápida expansão do pentecostalismo produziu um grave desvio ético na compreensão do Evangelho. Apareceu um novo fenômeno religioso, mais comumente identificado como "teologia da prosperidade". O que se ouve como "pregação", pelos tele-evangelistas e nas mega-igrejas dificilmente poderia ser associado ao protestantismo histórico ou ao pentecostalismo clássico.

Como não há mais nenhuma novidade em afirmar que mudanças radicais precisam acontecer no movimento evangélico, a questão agora é perguntar: O que tem que mudar? Eis algumas propostas:

Proponho uma espiritualidade menos eficiente. Que os pastores desistam de associar a aprovação de Deus para seus ministérios com projetos bem sucedidos. A fé cristã não se propõe a refletir o mundo corporativo em que competência se prova com resultados.

Na espiritualidade de Jesus, os atos de alguns servos de Deus podem ser anônimos, despercebidos e pequenos. A urgência das comunidades crescerem, de pastores provarem como Deus os abençoou com "ministérios aprovados" acabou produzindo essa excrescência: igrejas que mais se parecem com balcões de serviços religiosos do que com comunidades de fé.

Proponho uma espiritualidade menos cognitiva e mais vivenciada. A priorização da "reta doutrina" sobre a experiência da fé, acabou produzindo crentes argutos em "provar" a sua fé, mas bem frágeis no testemunho.

A obsessão pela verdade como uma construção racional faz com que os catecismos se tornem belas elaborações conceituais, enquanto os testemunhos pessoais se mantém questionáveis. O evangelho precisa ser escrito em tábuas de carne; mostrar-se nos atos daqueles que se propõem a brilhar como luz do mundo.

Proponho uma espiritualidade menos mágica e mais responsável. A idéia de um Deus intervencionista que invade a todo instante a história para resgatar seus filhos, dando-lhes alívio, abrindo portas de emprego e resolvendo querelas jurídicas, acabou produzindo crentes alienados, sem responsabilidade histórica e sem iniciativa profética.

Com esse comodismo, as igrejas se distanciaram da arena da vida. Acreditaram que bastaria amarrar os demônios territoriais para acabar com a violência e com a miséria. O Evangelho não propõe que a história seja transformada por encanto, mas com ações políticas que defendem a justiça.

Proponho uma espiritualidade menos intolerante. A idéia de um mundo perdidamente hostil a Deus gera igrejas intransigentes, que se enxergam privilegiadas. A radicalização da doutrina da queda faz com que se perceba o mundo condenado, irremediavelmente perdido. Com essa visão, a igreja se fecha, só encara o mundo como um campo de batalha, e é incapaz de acolher os moribundos que jazem nas margens das estradas.

A espiritualidade evangélica precisa resgatar doutrinas conhecidas nos primeiros anos da Reforma, como a Imago Dei (a imagem de Deus em todos) e a Graça Comum (o favor de Deus capacitando a todos).

Proponho uma espiritualidade que promova a vida. Os evangélicos pregaram por anos a fio a salvação da alma e, muitas vezes, se esqueceram que Deus deseja que experimentemos vida abundante antes da morte. Aliás, o céu deveria ser uma conseqüência das escolhas que as pessoas fizerem na terra e não uma promessa distante. Com essa ênfase exagerada na salvação da alma, alguns se contentam com uma existência sofrível, mal resolvida, acreditando que um dia, no além, tudo ficará bem.

Proponho uma espiritualidade que não contemple a santidade como apuro legal, mas como integridade. Com cobranças legalistas, os ambientes se tornam exigentes. É inócuo estabelecer o alvo da vida cristã como uma perfeição exagerada, que para alcançá-la seria necessário transformar as pessoas em anjos.

Hipocrisia nasce com esse tipo de exigência. É preciso dialogar com as imperfeições, com as sombras e luzes da alma; sem culpas e sem fobias. Só em ambientes assim, existe liberdade para amadurecer.

Proponho uma espiritualidade que estabeleça como objetivo, gerar homens e mulheres gentis, leais, misericordiosos. Antes de almejar aparecer como a instituição religiosa detentora da melhor compreensão da verdade, que procure amar com singeleza; antes de se tornar uma força política, que saiba caminhar entre os mais necessitados; antes de alcançar o mundo inteiro, que trabalhe ao lado dos constroem um mundo melhor.

Estou consciente que minhas propostas não têm muita chance de se realizarem, mas vou mantê-las como um horizonte utópico e vocação.

Soli Deo Gloria.

segunda-feira, 10 de março de 2008

Além da submissão (parte 6 de 6)

O amor não conhece outro caminho

Em segundo lugar, o amor distingue-se da justiça pela natureza dos seus motivos. A obediência legal é sempre induzida por estatutos definidos; o amor não. Uma vontade que dependa de um impulso externo como esse não compartilha da natureza do amor. O amor genuíno só recebe ordens de si mesmo. O fato de que outros estabeleçam como nosso alvo a verdadeira comunhão interpessoal não determinará que conduzamos uma vida cheia de amor; esse alvo, permanecendo para sempre em pé por seus próprios méritos, só pode ser compreendido por quem está cheio de amor, e que por livre escolha adota-o para si mesmo.

Além disso, como o amor é o reconhecimento, de dentro, de um alvo eterno, ele é guiado passo a passo por seu próprio caminho autodeterminado. O que por si mesmo julga ser, em suas próprias circunstâncias particulares, o melhor meio de alcançar o alvo eterno, regerá sempre a sua conduta; ele não conhece outro caminho. Caso se submetesse a quaisquer outras leis sua livre confiança seria dominada pelo medo, ou sua energia afundaria em indolência.

O amor genuíno só recebe ordens de si mesmo.

Mesmo que, como os heróicos fariseus, um homem sofra o martírio por sua fé, isto é, por obediência à lei, se não tiver em si mesmo algo dessa sinceridade e dessa independência do amor, de acordo com o apóstolo Paulo ele nada será.

A verdade é que, no que diz respeito ao tempo, o amor começa em todos os casos apenas quando uma pessoa experimenta o amor. Daí os esforços incessantes de Jesus no sentido de despertar nas pessoas um senso do amor inesgotável que na realidade experimentam. Uma vez que essa consciência nascente produza sua obra dinamizante, a pessoa possuíra vida em si mesma. Sua atividade não estará mais fundamentada, como se fosse mera transação, no interesse próprio, já que vantagens podem ser obtidas promovendo-se o bem-estar de outros; não será despertada por estímulos à simpatia, surgindo a partir de uma comunhão já estabelecida.

Uma vez que o amor venha à existência, sua operação será inteiramente autodeterminada. Não poderá aceitar leis vindas de fora, mas a partir de sua consciência interior outorgará a lei para si mesmo. Deixará de depender de um objeto digno de amor, como acontecia quando foi inicialmente despertado, mas, como o sol de Deus, distribuirá livremente e abundantemente, em todas as direções, suas riquezas peculiares.

A esse amor pertence a tranqüilidade sublime do poder criativo. Sua natureza e sua força são divinas. Jesus ensina que é assim, e diz ainda que o amor, e apenas o amor, é requerido de todo homem. O fato de que Jesus seja capaz de exigi-lo, por saber que será desperto esse livre a ativo poder do amor naqueles reunidos ao redor de si, em cujas vidas resplandece agora mesmo a luz pela sua manifestação de si mesmo - é isso o que a redenção representa para nós.

Adolf Harnack, em Ensaios sobre o Evangelho Social (1907)


Fonte: www.baciadasalmas.com.br